sábado, 26 de setembro de 2009

A forma justa

Sei que seria possível construir o mundo justo
As cidades poderiam ser claras e lavadas
Pelo canto dos espaços e das fontes
O céu o mar e a terra estão prontos
A saciar a nossa fome do terrestre
A terra onde estamos - se ninguém atraiçoasse - proporia
Cada dia a cada um a liberdade e o reino
- Na concha na flor no homem e no fruto
Se nada adoecer a própria forma é justa
E no todo se integra como palavra em verso
Sei que seria possível construir a forma justa
De uma cidade humana que fosse
Fiel à perfeição do universo

Por isso recomeço sem cessar a partir da página em branco
E este é meu ofício de poeta para a reconstrução do mundo


Sophia de Mello Breyner Andresen (1919-2004)



Enquanto preparava formação e depois de folhear (e não desfolhar - palavra aplicada erradamente, pois ao manusear um livro com certeza que não tiramos as folhas) alguns manuais, livros, cadernos, deparei-me com este poema que me despertou a atenção.

No mundo em que vivemos em que sonhamos com a justiça, com a harmonia, com a tolerância, com a solidariedade, com a paz, conseguimos construir e imaginar um mundo melhor. Das ideias e das palavras, passar às atitudes nunca foi nem nunca será fácil. Cada ser humano tem responsabilidade no mundo, tem que ser capaz de o melhorar, caso contrário acomodamo-nos e atribuímos os acontecimentos não a nós, que nada fazemos, mas aos outros que fazem por nós!
E se virássemos já a página e se começássemos a escrever numa página em branco tal como o poeta? Se o poeta tem o dom da escrita e aí encontra a forma justa, tenho a certeza que cada um de nós encontra a forma justa em cada dia, apenas nos falta a atitude, a coragem de lutarmos por essa forma. Vivemos num mundo diferente daquele que sonhamos e serenamente assistimos no mundo real às injustiças sem nada fazer.