sábado, 29 de novembro de 2008

Depois da ausência, a presença...

Eis que surge um acontecimento importante:a neve que teima em cair sobre a cidade da Guarda, neste final do mês de Novembro.


BALADA DA NEVE


Batem leve, levemente,
como quem chama por mim.
Será chuva? Será gente?
Gente não é, certamente
e a chuva não bate assim.

É talvez a ventania:
mas há pouco, há poucochinho,
nem uma agulha bulia
na quieta melancolia
dos pinheiros do caminho…

Quem bate, assim, levemente,
com tão estranha leveza,
que mal se ouve, mal se sente?
Não é chuva, nem é gente,
nem é vento com certeza.

Fui ver. A neve caía
do azul cinzento do céu,
branca e leve, branca e fria…
Há quanto tempo a não via!
E que saudades, Deus meu!

Olho-a através da vidraça.
Pôs tudo da cor do linho.
Passa gente e, quando passa,
os passos imprime e traça
na brancura do caminho…

Fico olhando esses sinais
da pobre gente que avança,
e noto, por entre os mais,
os traços miniaturais
duns pezitos de criança…

E descalcinhos, doridos…
a neve deixa inda vê-los,
primeiro, bem definidos,
depois, em sulcos compridos,
porque não podia erguê-los!…

Que quem já é pecador
sofra tormentos, enfim!
Mas as crianças, Senhor,
porque lhes dais tanta dor?!…
Porque padecem assim?!…

E uma infinita tristeza,
uma funda turbação
entra em mim, fica em mim presa.
Cai neve na Natureza
e cai no meu coração.

Augusto Gil

domingo, 7 de setembro de 2008

Andando pela Serra da Estrela





Era uma vez um jovem pastor que vivia em Manteigas e que tinha um sonho: mudar a sua vida, construir uma pequena casa onde pudesse viver com a sua Idalina.
Horácio partiu à procura desse sonho. Lutou, sofreu e ao longo da sua caminhada cumpre outros objectivos a que se propôs.

De Manteigas parte para a Covilhã, de aprendiz passa a tecelão.
Entretanto cruza-se com Marreta, o velho sábio tecelão, a pessoa que mais acompanha Horácio desde a Fábrica da Carpinteira à Aldeia do Carvalho, é ele que lhe fala do futuro, um futuro risonho onde não há guerra, miséria, pobreza, escravidão...


A LÃ E A NEVE de Ferreira de Castro


Um romance a não perder, um livro para conhecer a Covilhã dos anos 40 onde, sobrevivendo às consequências da II Guerra Mundial, as fábricas produziam,produziam... onde os operários se juntavam aos domingos no Pelourinho e onde as Portas do Sol se tornou num lugar de reflexão...

segunda-feira, 2 de junho de 2008

Festival Intercéltico

Situada no Concelho de Miranda do Douro, Sendim é uma vila localizada na região de Trás-os-Montes onde ainda se fala o Mirandês (a segunda Língua Oficial de Portugal).

Esta belíssima vila recebe o Festival Intercéltico há 9 anos.

Além de podermos desfrutar de uma fantástica paisagem, nesta zona do país, contemplamos o rio Douro enquanto linha divisória entre Portugal e Espanha, podemos ainda viver um ambiente de mistura de várias culturas, outros SONS (como a música celta)... tudo num só festival!!

Ficam aqui registados alguns desses momentos que três felizardas já tiveram o prazer de viver (imagens de Miranda do Douro e do Festival em Sendim).







E para os mais curiosos, uma sugestão:



sexta-feira, 30 de maio de 2008

Festival da Canção

E porque ainda estamos no mês de Maio, mês do Festival Eurovisão da Canção, vale a pena recordar.

Este Festival teve início em 1956, mas só em 1964 nos estreámos com a música Oração interpretada por António Calvário escolhida entre muitas no Festival RTP da Canção.

A nossa melhor classificação é o 6º lugar que pertence a Lúcia Moniz no ano de 1996.

Desde 1964 que muitos êxitos tocam na rádio, na televisão e agora no Karaoke, tornando deste modo famosos muitos cantores. Algumas canções vão caindo no esquecimento, outras há que permanencem nas nossas memórias. Recordo principalmente as dos anos 80 e 90. Quem não se lembra de Carlos Paião? Ou Manuela Bravo (1979)? As Doce? Dora? Dina? E os DA VINCI com a música "Conquistador"? Uma música que merece ser escutada com atenção não só pela sua sonoridade como também pela letra, bastante positiva e que nos remete para um período importante da nossa História. Aqui fica o videoclip.




Também a canção deste ano Senhora do Mar esteve muito bem representada pela madeirense Vânia Fernandes.
Atrevo-me a dizer que é a melhor canção seleccionada no Festival RTP da Canção dos últimos 10 anos.


domingo, 18 de maio de 2008

Madeira ainda é Portugal

"Então, estás a gostar de Portugal?" - Frase dirigida a uma colega madeirense, caloira na UBI.

A Pérola do Atlântico é um bonito arquipélago que não faz parte de Portugal Continental, mas pertence a este país a que chamamos PORTUGAL. Possui paisagens e locais magníficos, onde se encontra a verdadeira força da natureza. Um dos locais de Portugal a visitar!

Aqui ficam algumas provas fotográficas minhas e do Hélder do verão de 2006.


Ponta do Sol



O "Hawai" da Ponta do Sol"


Um pormenor da Ponta do Sol :)



Um pormenor da Ribeira Brava



Piscinas naturais de...


... Porto Moniz



Miradouro Bica da Cana




Do Farol

Madalena do Mar



Porto Cruz



Santana



Parque das Queimadas (883 m de altitude)



Curral das Freiras



Funchal



Finalizo com a famosa espetada madeirense, a deliciosa banana e a saborosa poncha:))

Aqui fica apenas uma amostra de uma ilha a descobrir...

segunda-feira, 5 de maio de 2008

Em Portugal ainda existem aventureiros

En Portugal todavía hay aventureros.






El pasado mes de Marzo tres portugueses de Guarda partieron hacia Argentina con el fin de recorrer cerca de 1000km de bicicleta.

El recorrido empezó en Chile (en el pueblo Chile-Chico) y terminó en Ushuaia, la tierra del fin del mundo (en suelo argentino).

En más o menos diecisiete días han recorrido Patagónia y la Tierra del Fuego. Una experiencia muy rica. Han visto muchos glaciares, muchos animales, paisajes bonitos y mucho más, todo eso con la ayuda de un vehículo.

El coraje de los aventureros de hoy es diferente al coraje de los aventureros de hace 600 años. Antes se descubrían tierras nunca vistas, ahora se descubren lugares mágicos.

Para visitar las imágenes del recorrido haga clic aquí:


http://guardabtt-na-patagonia.blogspot.com/



Aunque seamos un pueblo demasiado triste, melancólico, (se puede comprobar en el Fado), tenemos ganas de descubrir el mundo, hacer cosas muy diferentes, conocer otras culturas, aprender algo más. Además somos hospitalarios, hablamos algunos idiomas y tenemos lugares muy bonitos para visitar.


domingo, 4 de maio de 2008

Poema à mãe

No mais fundo de ti,
eu sei que traí, mãe!

Tudo porque já não sou
o retrato adormecido
no fundo dos teus olhos!

Tudo porque tu ignoras
que há leitos onde o frio não se demora
e noites rumorosas de águas matinais!

Por isso, às vezes, as palavras que te digo
são duras, mãe,
e o nosso amor é infeliz.

Tudo porque perdi as rosas brancas
que apertava junto ao coração
no retrato da moldura!

Se soubesses como ainda amo as rosas,
talvez não enchesses as horas de pesadelos...

Mas tu esqueceste muita coisa!
Esqueceste que as minhas pernas cresceram,
que todo o meu corpo cresceu,
e até o meu coração
ficou enorme, mãe!

Olha - queres ouvir-me? -,
às vezes ainda sou o menino
que adormeceu nos teus olhos;

ainda aperto contra o coração
rosas tão brancas
como as que tens na moldura;

ainda oiço a tua voz:
"Era uma vez uma princesa
no meio de um laranjal..."

Mas - tu sabes! - a noite é enorme
e todo o meu corpo cresceu...

Eu saí da moldura,
dei às aves os meus olhos a beber.

Não me esqueci de nada, mãe.
Guardo a tua voz dentro de mim.
E deixo-te as rosas...

Boa noite. Eu vou com as aves!

Eugénio de Andrade

quinta-feira, 1 de maio de 2008

Repercussões do dia 1 de Maio de 1974

Todos nós sabemos que hoje é feriado, que podemos dormir mais um pouco, que podemos passear pois para a maioria é dia descanso. Mas algo aconteceu neste dia, há 34 anos atrás, com repercussões por todo o país.

Pela primeira vez em Portugal, decorreu uma enorme manifestação com centenas de milhares de pessoas a percorrerem as ruas da capital sob o lema "O POVO UNIDO JAMAIS SERÁ VENCIDO", que culminou com um comício onde discursaram: representantes do Movimento de Esquerda Socialista, da Intersindical (que funcionava clandestinamente desde 1970) mas as palavras mais aguardadas eram, sem dúvida, as de Álvaro Cunhal e Mário Soares.
Desta forma, foi comemorado pela primeira vez o Dia do Trabalhador, não por falta de tentativas em ano anteriores, pois estas eram continuamente reprimidas pelo regime salazarista.

"Este foi o reconhecimento popular da
Revolução dos Cravos."


Outras manifestações decorreram nos dias seguintes, organizadas por vários movimentos de trabalhadores.




Foi no dia 5 de Maio de 1974 que nasceu o Sindicato Nacional dos Trabalhadores dos Correios e Telecomunicações. Mais de 10.000 trabalhadores da empresa pública Correios e Telecomunicações de Portugal reuniram-se no Pavilhão dos Desportos (agora Pavilhão Carlos Lopes) para assistir ao comício onde viria a nascer este sindicato.
É com orgulho que o meu pai me relata este dia tão intenso e tão presente na sua memória, vivido entre colegas seus de Arganil e outros ainda a quem se juntaram:
- Assistimos ao comício e só depois caminhámos desde o pavilhão, atravessando a Avenida da Liberdade e terminando na Praça do Comércio sempre a gritar "O POVO UNIDO JAMAIS SERÁ VENCIDO".


sexta-feira, 25 de abril de 2008

As Portas que Abril Abriu


Era uma vez um país
onde entre o mar e a guerra
vivia o mais infeliz
dos povos à beira-terra.

Onde entre vinhas sobredos
vales socalcos searas
serras atalhos veredas
lezírias e praias claras
um povo se debruçava
como um vime de tristeza
sobre um rio onde mirava
a sua própria pobreza.

Era uma vez um país
onde o pão era contado
onde quem tinha a raiz
tinha o fruto arrecadado
onde quem tinha o dinheiro
tinha o operário algemado
onde suava o ceifeiro
que dormia com o gado
onde tossia o mineiro
em Aljustrel ajustado
onde morria primeiro
quem nascia desgraçado.


Era uma vez um país
de tal maneira explorado
pelos consórcios fabris
pelo mando acumulado
pelas ideias nazis
pelo dinheiro estragado
pelo dobrar da cerviz
pelo trabalho amarrado
que até hoje já se diz
que nos tempos do passado
se chamava esse país
Portugal suicidado.

Ali nas vinhas sobredos
vales socalcos searas
serras atalhos veredas
lezírias e praias claras
vivia um povo tão pobre
que partia para a guerra
para encher quem estava podre
de comer a sua terra.

Um povo que era levado
para Angola nos porões
um povo que era tratado
como a arma dos patrões
um povo que era obrigado
a matar por suas mãos
sem saber que um bom soldado
nunca fere os seus irmãos.

Ora passou-se porém
que dentro de um povo escravo
alguém que lhe queria bem
um dia plantou um cravo.

Era a semente da esperança
feita de força e vontade
era ainda uma criança
mas já era a liberdade.

Era já uma promessa
era a força da razão
do coração à cabeça
da cabeça ao coração.
Quem o fez era soldado
homem novo capitão
mas também tinha a seu lado
muitos homens na prisão.

Esses que tinham lutado
a defender um irmão
esses que tinham passado
o horror da solidão
esses que tinham jurado
sobre uma côdea de pão
ver o povo libertado
do terror da opressão.

Não tinham armas é certo
mas tinham toda a razão
quando um homem morre perto
tem de haver distanciação

uma pistola guardada
nas dobras da sua opção
uma bala disparada
contra a sua própria mão
e uma força perseguida
que na escolha do mais forte
faz com que a força da vida
seja maior do que a morte.

Quem o fez era soldado
homem novo capitão
mas também tinha a seu lado
muitos homens na prisão.

Posta a semente do cravo
começou a floração
do capitão ao soldado
do soldado ao capitão.

Foi então que o povo armado
percebeu qual a razão
porque o povo despojado
lhe punha as armas na mão.

Pois também ele humilhado
em sua própria grandeza
era soldado forçado
contra a pátria portuguesa.

Era preso e exilado
e no seu próprio país
muitas vezes estrangulado
pelos generais senis.

Capitão que não comanda
não pode ficar calado
é o povo que lhe manda
ser capitão revoltado
é o povo que lhe diz
que não ceda e não hesite
– pode nascer um país
do ventre duma chaimite.

Porque a força bem empregue
contra a posição contrária
nunca oprime nem persegue
– é força revolucionária!

Foi então que Abril abriu
as portas da claridade
e a nossa gente invadiu
a sua própria cidade.

Disse a primeira palavra
na madrugada serena
um poeta que cantava
o povo é quem mais ordena.

E então por vinhas sobredos
vales socalcos searas
serras atalhos veredas
lezírias e praias claras
desceram homens sem medo
marujos soldados «páras»
que não queriam o degredo
dum povo que se separa.
E chegaram à cidade
onde os monstros se acoitavam
era a hora da verdade
para as hienas que mandavam
a hora da claridade
para os sóis que despontavam
e a hora da vontade
para os homens que lutavam.

Em idas vindas esperas
encontros esquinas e praças
não se pouparam as feras
arrancaram-se as mordaças
e o povo saiu à rua
com sete pedras na mão
e uma pedra de lua
no lugar do coração.

Dizia soldado amigo
meu camarada e irmão
este povo está contigo
nascemos do mesmo chão
trazemos a mesma chama
temos a mesma ração
dormimos na mesma cama
comendo do mesmo pão.
Camarada e meu amigo
soldadinho ou capitão
este povo está contigo
a malta dá-te razão.

Foi esta força sem tiros
de antes quebrar que torcer
esta ausência de suspiros
esta fúria de viver
este mar de vozes livres
sempre a crescer a crescer
que das espingardas fez livros
para aprendermos a ler
que dos canhões fez enxadas
para lavrarmos a terra
e das balas disparadas
apenas o fim da guerra.

Foi esta força viril
de antes quebrar que torcer
que em vinte e cinco de Abril
fez Portugal renascer.

E em Lisboa capital
dos novos mestres de Aviz
o povo de Portugal
deu o poder a quem quis.

Mesmo que tenha passado
às vezes por mãos estranhas
o poder que ali foi dado
saiu das nossas entranhas.
Saiu das vinhas sobredos
vales socalcos searas
serras atalhos veredas
lezírias e praias claras
onde um povo se curvava
como um vime de tristeza
sobre um rio onde mirava
a sua própria pobreza.

E se esse poder um dia
o quiser roubar alguém
não fica na burguesia
volta à barriga da mãe.
Volta à barriga da terra
que em boa hora o pariu
agora ninguém mais cerra
as portas que Abril abriu.

Essas portas que em Caxias
se escancararam de vez
essas janelas vazias
que se encheram outra vez
e essas celas tão frias
tão cheias de sordidez
que espreitavam como espias
todo o povo português.

Agora que já floriu
a esperança na nossa terra
as portas que Abril abriu
nunca mais ninguém as cerra.

Contra tudo o que era velho
levantado como um punho
em Maio surgiu vermelho
o cravo do mês de Junho.

Quando o povo desfilou
nas ruas em procissão
de novo se processou
a própria revolução.

Mas eram olhos as balas
abraços punhais e lanças
enamoradas as alas
dos soldados e crianças.

E o grito que foi ouvido
tantas vezes repetido
dizia que o povo unido
jamais seria vencido.

Contra tudo o que era velho
levantado como um punho
em Maio surgiu vermelho
o cravo do mês de Junho.

E então operários mineiros
pescadores e ganhões
marçanos e carpinteiros
empregados dos balcões
mulheres a dias pedreiros
reformados sem pensões
dactilógrafos carteiros
e outras muitas profissões
souberam que o seu dinheiro
era presa dos patrões.

A seu lado também estavam
jornalistas que escreviam
actores que se desdobravam
cientistas que aprendiam
poetas que estrebuchavam
cantores que não se vendiam
mas enquanto estes lutavam
é certo que não sentiam
a fome com que apertavam
os cintos dos que os ouviam.

Porém cantar é ternura
escrever constrói liberdade
e não há coisa mais pura
do que dizer a verdade.

E uns e outros irmanados
na mesma luta de ideais
ambos sectores explorados
ficaram partes iguais.

Entanto não descansavam
entre pragas e perjúrios
agulhas que se espetavam
silêncios boatos murmúrios
risinhos que se calavam
palácios contra tugúrios
fortunas que levantavam
promessas de maus augúrios
os que em vida se enterravam
por serem falsos e espúrios
maiorais da minoria
que diziam silenciosa
e que em silêncio fazia
a coisa mais horrorosa:
minar como um sinapismo
e com ordenados régios
o alvor do socialismo
e o fim dos privilégios.

Foi então se bem vos lembro
que sucedeu a vindima
quando pisámos Setembro
a verdade veio acima.

E foi um mosto tão forte
que sabia tanto a Abril
que nem o medo da morte
nos fez voltar ao redil.

Ali ficámos de pé
juntos soldados e povo
para mostrarmos como é
que se faz um país novo.

Ali dissemos não passa!
E a reacção não passou.
Quem já viveu a desgraça
odeia a quem desgraçou.

Foi a força do Outono
mais forte que a Primavera
que trouxe os homens sem dono
de que o povo estava à espera.

Foi a força dos mineiros
pescadores e ganhões
operários e carpinteiros
empregados dos balcões
mulheres a dias pedreiros
reformados sem pensões
dactilógrafos carteiros
e outras muitas profissões
que deu o poder cimeiro
a quem não queria patrões.

Desde esse dia em que todos
nós repartimos o pão
é que acabaram os bodos
— cumpriu-se a revolução.

Porém em quintas vivendas
palácios e palacetes
os generais com prebendas
caciques e cacetetes
os que montavam cavalos
para caçarem veados
os que davam dois estalos
na cara dos empregados
os que tinham bons amigos
no consórcio dos sabões
e coçavam os umbigos
como quem coça os galões
os generais subalternos
que aceitavam os patrões
os generais inimigos
os generais garanhões
teciam teias de aranha
e eram mais camaleões
que a lombriga que se amanha
com os próprios cagalhões.
Com generais desta apanha
já não há revoluções.

Por isso o onze de Março
foi um baile de Tartufos
uma alternância de terços
entre ricaços e bufos.

E tivemos de pagar
com o sangue de um soldado
o preço de já não estar
Portugal suicidado.

Fugiram como cobardes
e para terras de Espanha
os que faziam alardes
dos combates em campanha.

E aqui ficaram de pé
capitães de pedra e cal
os homens que na Guiné
aprenderam Portugal.

Os tais homens que sentiram
que um animal racional
opõe àqueles que o firam
consciência nacional.

Os tais homens que souberam
fazer a revolução
porque na guerra entenderam
o que era a libertação.

Os que viram claramente
e com os cinco sentidos
morrer tanta tanta gente
que todos ficaram vivos.

Os tais homens feitos de aço
temperado com a tristeza
que envolveram num abraço
toda a história portuguesa.

Essa história tão bonita
e depois tão maltratada
por quem herdou a desdita
da história colonizada.

Dai ao povo o que é do povo
pois o mar não tem patrões.
– Não havia estado novo
nos poemas de Camões!

Havia sim a lonjura
e uma vela desfraldada
para levar a ternura
à distância imaginada.

Foi este lado da história
que os capitães descobriram
que ficará na memória
das naus que de Abril partiram

das naves que transportaram
o nosso abraço profundo
aos povos que agora deram
novos países ao mundo.

Por saberem como é
ficaram de pedra e cal
capitães que na Guiné
descobriram Portugal.

E em sua pátria fizeram
o que deviam fazer:
ao seu povo devolveram
o que o povo tinha a haver:
Bancos seguros petróleos
que ficarão a render
ao invés dos monopólios
para o trabalho crescer.
Guindastes portos navios
e outras coisas para erguer
antenas centrais e fios
dum país que vai nascer.

Mesmo que seja com frio
é preciso é aquecer
pensar que somos um rio
que vai dar onde quiser

pensar que somos um mar
que nunca mais tem fronteiras
e havemos de navegar
de muitíssimas maneiras.

No Minho com pés de linho
no Alentejo com pão
no Ribatejo com vinho
na Beira com requeijão
e trocando agora as voltas
ao vira da produção
no Alentejo bolotas
no Algarve maçapão
vindimas no Alto Douro
tomates em Azeitão
azeite da cor do ouro
que é verde ao pé do Fundão
e fica amarelo puro
nos campos do Baleizão.
Quando a terra for do povo
o povo deita-lhe a mão!

É isto a reforma agrária
em sua própria expressão:
a maneira mais primária
de que nós temos um quinhão
da semente proletária
da nossa revolução.

Quem a fez era soldado
homem novo capitão
mas também tinha a seu lado
muitos homens na prisão.

De tudo o que Abril abriu
ainda pouco se disse
um menino que sorriu
uma porta que se abrisse
um fruto que se expandiu
um pão que se repartisse
um capitão que seguiu
o que a história lhe predisse
e entre vinhas sobredos
vales socalcos searas
serras atalhos veredas
lezírias e praias claras
um povo que levantava
sobre um rio de pobreza
a bandeira em que ondulava
a sua própria grandeza!
De tudo o que Abril abriu
ainda pouco se disse
e só nos faltava agora
que este Abril não se cumprisse.
Só nos faltava que os cães
viessem ferrar o dente
na carne dos capitães
que se arriscaram na frente.

Na frente de todos nós
povo soberano e total
que ao mesmo tempo é a voz
e o braço de Portugal.

Ouvi banqueiros fascistas
agiotas do lazer
latifundiários machistas
balofos verbos de encher
e outras coisas em istas
que não cabe dizer aqui
que aos capitães progressistas
o povo deu o poder!
E se esse poder um dia
o quiser roubar alguém
não fica na burguesia
volta à barriga da mãe!
Volta à barriga da terra
que em boa hora o pariu
agora ninguém mais cerra
as portas que Abril abriu!

Ary dos Santos


quarta-feira, 23 de abril de 2008

Dia Mundial do Livro

Há quem diga que o verdadeiro analfabeto é aquele que aprendeu a ler e não lê.

Pensar num livro não significa ler 300 páginas ou mais :). O importante é ler. Por isso mesmo aqui deixo a sugestão do dia: Um conto de Vergílio Ferreira.




Um conto cheio de sonhos, simplicidades, audácias, ingenuidades, palavras repletas de som, luz e um final inesperado, tudo em 29 páginas.

PORQUE LER É PRECISO!


domingo, 20 de abril de 2008

Um livro que todos deveriam ler

De uma conversa de café com um amigo, surgiu um nome, um autor, um tema que rapidamente despertou a minha atenção.
Ocasionalmente encontrei este livro numa estação de Correios "bem perto de si";). Bastaram quatro dias para "devorar" este livro, uma obra simplesmente extraordinária retratando um tema bem actual. Para mim, um grito de alerta.

Relata uma forma bem diferente de ver o nosso mundo, os procedimentos que tomamos, os que deveriamos ter para travar este problema.

José Rodrigues dos Santos, o jornalista (famoso por nos piscar o olho todas as noites;)), transmite de forma clara e evidente a mensagem do livro.
O aquecimento global é um tema que deveria ser mais debatido entre nós, nos meios de comunicação social como forma de alertar os espectadores, bem como deveriam existir regras mais fortes, rígidas implementadas por todos os governos do mundo.

A questão que aqui se coloca é se, na verdade, todos terão o mesmo interesse em atenuar o problema. Temos grandes potências a liderar o mundo...(infelizmente).
Acredito que estamos a tempo de salvar o nosso planeta, ou melhor, adiar a catástrofe. Mas para isso é necessário que se acabem com as guerras, os interesses sórdidos... utópico, não é? Mas nada é impossível.

A UNIÃO FAZ MILAGRES!

Se todos lermos este livro poderá ser um bom começo, haverá mudanças radicais. Comigo já aconteceu. Não consigo ficar indiferente a esta deslealdade para com o mundo e para as gerações futuras. Essas sim, irão sofrer as verdadeiras consequências.
O meu dia-a-dia mudou, a alteração de certos hábitos pode dar o seu contributo. Sim, sei que é uma gota no oceano, mas se todos fizermos um pouco...nada custa.

OBRIGADA a José Rodrigues dos Santos que se tornou num líder de vendas, com uma literatura de intervenção.

BEM-HAJA!






sexta-feira, 21 de março de 2008

A propósito do Dia Mundial da Poesia

QUEM

Não sei como se ressuscita
no terceiro dia
de cada sílaba
nem se há palavra para voltar
do grando rio
do esquecimento.
Não sei se no terceiro dia alguém me espera. Ou se
ninguém.
Em cada poema levanto a pedra
em cada poema pergunto quem.


In Livro do Português Errante de Manuel Alegre

quarta-feira, 19 de março de 2008

Com o meu pai...

...aprendi a gostar de Fado.

É um gosto que trago comigo há já muito tempo...mas até à data nunca lhe tinha dado espaço para se manifestar. Além de ser um tipo de música bem típico português, muitas das letras, músicas são o retrato de um povo que traz consigo a melancolia, a saudade, enfim, sentimentos que nos caracterizam. Mas somos únicos!

Carlos do Carmo, Alfredo Marceneiro, Camané, Mariza e, claro, Amália Rodrigues... Fado Experimental, Fado Menor são alguns dos nomes e vocábulos que associamos ao Fado.

Agora descubram a razão pela qual Mariza se tornou numa fadista tão especial e tão conhecida mundialmente...


Loucura





Sou do fado
Como sei
Vivo um poema cantado
De um fado que eu inventei

A falar
Não posso dar-me
Mas ponho a alma a cantar
E as almas sabem escutar-me

Chorai, chorai
Poetas do meu país
Troncos da mesma raíz
Da vida que nos juntou

E se vocês
não estivessem a meu lado
Então não havia fado
Nem fadistas como eu sou

Esta voz
tão dolorida
É culpa de todos vós
Poetas da minha vida

É loucura,
ouço dizer
Mas bendita esta loucura
de cantar e de sofrer

Chorai, chorai
Poetas do meu país
Troncos da mesma raíz
Da vida que nos juntou

E se vocês
não estivessem a meu lado
Então não havia fado
Nem fadistas como eu sou.


CHUVA




As coisas vulgares que há na vida
Não deixam saudades
Só as lembranças que doem
Ou fazem sorrir

Há gente que fica na história
da história da gente
e outras de quem nem o nome
lembramos ouvir

São emoções que dão vida
à saudade que trago
Aquelas que tive contigo
e acabei por perder

Há dias que marcam a alma
e a vida da gente
e aquele em que tu me deixaste
não posso esquecer

A chuva molhava-me o rosto
Gelado e cansado
As ruas que a cidade tinha
Já eu percorrera

Ai... meu choro de moça perdida
gritava à cidade
que o fogo do amor sob chuva
há instantes morrera

A chuva ouviu e calou
meu segredo à cidade
E eis que ela bate no vidro
Trazendo a saudade .

sábado, 8 de março de 2008

Uma poetisa chamada Sophia

Sophia de Mello Breyner Andresen foi a primeira mulher portuguesa a receber o prémio literário mais importante da língua portuguesa: Prémio Camões, decorria o ano de 1999.


Além de se dedicar à poesia, aos contos (como o bem conhecido "Cavaleiro da Dinamarca"), lutou contra o regime salazarista, e mais tarde ocupou um cargo político.

Toda a sua obra poética é dotada de uma magia, uma sensibilidade, uma delicadeza, um encontro de palavras pautadas de uma musicalidade constante.

Ficam aqui alguns exemplos...



Porque

Porque os outros se mascaram mas tu não
Porque os outros usam a virtude
Para comprar o que não tem perdão
Porque os outros têm medo mas tu não

Porque os outros são os túmulos caiados
Onde germina calada a podridão.
Porque os outros se calam mas tu não.

Porque os outros se compram e se vendem
E os seus gestos dão sempre dividendo.
Porque os outros são hábeis mas tu não.

Porque os outros vão à sombra dos abrigos
E tu vais de mãos dadas com os perigos.
Porque os outros calculam mas tu não.





Liberdade

Aqui nesta praia onde

Não há nenhum vestígio de impureza,

Aqui onde há somente

Ondas tombando ininterruptamente,

Puro espaço e lúcida unidade,

Aqui o tempo apaixonadamente

Encontra a própria liberdade.

sexta-feira, 7 de março de 2008

Peripécia Teatro


Andávamos a passear por terras de Sendim, perto de Miranda do Douro, participando no Festival Intercéltico realizado todos os anos no mês de Agosto, quando nos deparámos com a actuação de um pequeno grupo de três actores, representando a peça de teatro Iberia.

Excelente peça! Retrata alguns acontecimentos históricos comum aos dois países (Portugal e Espanha), bem como episódios bem conhe
cidos e grandes heróis da cultura. É um retrato feito com muito profissionalismo, muito humor e uma espotaneidade rara.
Não é por acaso que já é a terceira vez que assisto a este fabuloso acontecimento.
Participaram na festa da pequena aldeia do Freixo, trazendo esta mesma peça, em 2006, o que para nós, organização, se tornou num grande orgulho.

Hoje, dia 7 de Março, sexta-feira, regressam à Beira Alta, mais propriamente ao Teatro Municipal da Guarda, pelas 21h30 com uma outra peça: Novecentos - O Pianista do Oceano.


A não perder!

Página Oficial:
http://peripeciateatro.paloalto.pt

domingo, 2 de março de 2008

José Simões Dias


Simões Dias nasceu a cinco de Fevereiro de 1844 na Benfeita. Professor, político, jornalista, poeta... enfim, um grande homem do seu tempo.
Aqui fica um pequeno registo da subtileza e da suavidade das suas palavras.



Berço de rosas

Eu tinha um berço de rosas
Que minha mãe embalava;
Rouxinois ao desafio
Cantavam quando eu chorava!

Era a tua voz e a dela,
Vê que música seria!...
Eu então cerrava os olhos
E a sorrir adormecia!

Adormecia e quem sabe
Se o teu doce olhar, criança,
Não pousava no meu berço
Como um luar de esperança!

O que eu sei é que inda agora,
Quando escuto uma cantiga
Das que eu ouvia, estremeço,
Não sei porquê, doce amiga!

Lembram-me os dias felizes,
Os dias da mocidade
As infantis alegrias
Daquela ditosa idade!

(...)

In Peninsulares




sábado, 1 de março de 2008

Benfeita, um local a visitar

Freguesia do Concelho de Arganil, Distrito de Coimbra.

"Os mais antigos documentos que se referem à Benfeita remontam ao ano de 1195 quando ainda pertencia à vila de Coja. Em 1300 foi concedido à Benfeita a carta de foral."

Vista parcial, desde a Fonte das Moscas




Com cerca de 11 metros, situa-se junto à Capela de Santa Rita a Torre da Paz, em tempos conhecida como a Torre Salazar. Foi erguida em 1945, ano terminus da II Grande Guerra Mundial. E foi com essa intenção que o povo benfeitense teve o interesse de construir esta torre. Por um lado, serviu para homenagear o então chefe de Estado António Salazar e a sua política internacional que livrou Portugal da Guerra. Por outro lado a Torre pretende perpetuar a paz e por isso ainda hoje a 7 de Maio de todos os anos (data da rendição da Alemanha em 1945) o sino da torre soa em toda a aldeia batendo 1620 badaladas cerca de duas horas, em comemoração da paz.



















Inserida na Área Protegida da Serra do Açor, a Mata da Margaraça constitui um local onde se pode admirar a beleza da natureza.




Com cerca de 70m de altura, trata-se de um dos locais mais bonitos do Concelho de Arganil: a Fraga da Pena.


Site oficial da Benfeita: http://benfeita.planetaclix.pt


Não poderia deixar de terminar esta pequena viagem pela aldeia da Benfeita, sem agradecer ao João, amigo de infância, que me guiou na redescoberta da nova aldeia:)


quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008

No tempo em que Deus criou todas as coisas

No tempo em que Deus criou todas as coisas,
criou o sol,
E o sol nasce, e morre, e volta a nascer;
Criou a lua,
E a lua nasce, e morre, e volta a nascer;
Criou as estrelas,
E as estrelas nascem, e morrem, e voltam a nascer;
Criou o homem,
E o homem nasce, e morre, e não volta a nascer.


In Poesia Toda de Helberto Helder

domingo, 17 de fevereiro de 2008

O meu olhar é nítido como um girassol

O meu olhar é nítido como um girassol.
Tenho o costume de andar pelas estradas
Olhando para a direita e para esquerda,
E de vez em quando olhando para trás...
E o que vejo a cada momento
É aquilo que nunca antes eu tinha visto,
E eu sei dar isso muito bem...
Sei ter pasmo essencial
Que tem uma criança se, ao nascer,
Reparasse que nascera deveras...
Sinto-me nascido a cada momento
Para a eterna novidade do mundo...

Creio no mundo como num malmequer,
Porque o vejo. Mas não penso nele
Porque pensar é não compreender...
O Mundo não se fez para pensarmos nele
Porque pensar é não compreender...
O Mundo não se fez para pensarmos nele
(Pensar é estar doente dos olhos)
Mas para olharmos para ele e estarmos de acordo...

Eu não tenho filosofia: tenho sentidos...
Se falo na Natureza não é porque saiba o que ela é,
Mas porque a amo, e amo-a por isso,
Porque que ama nunca sabe o que ama
Nem sabe porque ama, nem o que é amar...

Amar é a eterna inocência,
E a única inocência não pensar...

Alberto Caeiro



Sirvo-me do verso de um dos meus poemas preferidos para atribuir nome ao meu blogue. Depois de uma luta desenfreada sem saber muito bem que nome atribuir, ousei inserir este poema de Alberto Caeiro (heterónimo de Fernando Pessoa) para inaugurar este meu espaço.

Com isto, pretendo que cada olhar procure valorizar o mundo que o rodeia e procurar as energias positivas que a Natureza nos transmite, tal como o girassol que procura o Sol.
Em tudo na vida há algo positivo, mesmo na mais escura das paisagens, como o pôr-do-sol, a noite... Há que descobrir com os sentidos: olhar, ver, cheirar, tocar e ouvir... vivendo o presente, e "de vez em quando olhando para trás".

Com este espaço, pretendo divulgar tudo o que de bom se faz ou fez por cá, por Portugal! Muitas vezes não valorizamos o que realmente temos. É muito bom criticar e "trazer para cá", tudo o que não nos pertence... Saibamos valorizar e levar para além das fronteiras um pouco de nós, da nossa cultura. É verdade que quando estamos distantes aprendemos a valorizar o que temos... em parte foi o que me aconteceu... mas as mudanças trazem sempre coisas positivas!
É um pouco de mim que ficará aqui registado, as aprendizagens que fiz ao longo da vida bem como as que continuo a fazer...

Este espaço também pode ser vosso: espero as vossas sugestões, as vossas críticas, os vossos comentários.

Até breve!